Breve histórico da psicoterapia
A partir de uma perspectiva histórica, a psicoterapia como um método de tratamento bem como um objeto de estudo pode ser considerada uma prática bastante recente. Embora para alguns ela seja apontada como um método antigo de cura, o “cuidado da alma” que remete, pelo menos, à Grécia antiga, suas primeiras sistematizações técnicas e teóricas datam do final do século 18 e podem ser compreendidas como fruto das profundas transformações sociais em movimento na época.
Nas sociedades tradicionais, o indivíduo adentrava o mundo já ligado a uma certa tradição, que lhe vinculava a uma posição e uma função social previamente determinadas através da filiação. Ou seja, o indivíduo dispunha de uma herança que o aguardava, na qual encontrava as restrições morais e os mitos que as legitimavam já claramente prescritos e vigentes no código da cultura.
A modernidade trouxe consigo um modelo individualista, em oposição ao coletivismo anterior e essas transformações repercutiram de forma profunda na vida mental e emocional dos indivíduos, tornando-a mais complexa e consequentemente mais vulnerável. A partir daí, surge a necessidade de aportes focados na psique, que se proponham a ajudar os sujeitos a darem conta dessas novas demandas: entre eles, a psicoterapia. A partir de então foi possível observar um crescimento gradativo e a proliferação de diferentes abordagens, até a consequente consolidação da psicoterapia enquanto ciência independente, não mais sendo considerada apenas um ramo da psiquiatria ou psicologia clínica.
Ou seja, a psicoterapia nasceu como uma ferramenta que se propõe a ajudar os indivíduos a lidarem com a complexidade da vida. Seu método foi gradativamente sendo aprimorado e atualmente ela é considerada uma ferramenta de excelência na busca pela expansão da consciência, da liberdade de escolha e da capacidade de pensar por conta própria. Ao ampliarmos nosso espaço mental, aumentamos significativamente nossas possibilidades de conter as divergências, as ambivalências e a angústia que resulta delas. Consequentemente, passamos a compreender o papel que desempenhamos em nossa própria infelicidade ou desconforto, assim como possíveis sabotadores internos e modelos de funcionamento inconscientes.
Considero este vídeo produzido pela The School of Life uma brilhante ilustração da psicoterapia, que contextualiza e aborda de um jeito bem-humorado alguns pontos que são frequentemente curiosidade de muitas pessoas.
Como a psicoterapia é praticada no Brasil?
No contexto brasileiro, a prática da psicoterapia está predominantemente associada à medicina, ao tratamento de transtornos mentais. Por essa razão, a crença popular por vezes sugere a ideia de que buscar um profissional e iniciar um processo terapêutico significa que a pessoa está doente, atribuindo um significado pejorativo, no sentido de uma fraqueza. Em outros países, como por exemplo na Argentina, a psicoterapia (especialmente a de orientação psicanalítica tem grande tradição) está associada ao desenvolvimento pessoal, ou seja, não pressupõe no senso comum que o sujeito que a busca está doente, pelo contrário, sinaliza que esta pessoa está investindo em seu crescimento. Em outras palavras, há a atribuição de um valor social positivo e não pejorativo.
Ciência e Psicoterapia
Pesquisa em psicoterapia
Os primeiros trabalhos considerados originários da pesquisa em psicoterapia são os Estudos sobre a Histeria de Breuer e Freud publicados em 1895. Eles relatavam estudos de caso a partir de considerações sobre a neurofisiologia e aspectos psicológicos dos pacientes. Freud buscou suporte para suas hipóteses principalmente em seus casos clínicos. Através deles, ele podia explorar mais profundamente alguns aspectos do processo terapêutico e assim gerar hipóteses a serem investigadas de forma sistemática.
Cenário atual da pesquisa em psicoterapia
Como brevemente descrito anteriormente, a prática da psicoterapia evoluiu ao longo de mais de 100 anos através de vários modelos explicativos teóricos e, consequentemente, inúmeras variedades de técnicas. Algumas abordagens focam na centralidade da emoção, enquanto outras se concentram na cognição e comportamento manifesto. Simultaneamente, algumas técnicas exigem a “neutralidade” do psicoterapeuta, enquanto outras pregam um “engajamento ativo”.
Inúmeras evidências já demonstraram a eficácia de uma variedade de modalidades de psicoterapia no tratamento de uma série de transtornos psicológicos e psiquiátricos. Especificamente em relação à psicoterapia psicanalítica, ao longo dos últimos anos, muitos estudos vêm apresentando evidências consistentes da sua eficácia e efetividade especialmente nas modalidades breves e de formas específicas de psicoterapia psicanalítica de longo prazo relativas a uma ampla gama de transtornos e condições. Parece não haver mais dúvida em relação aos benefícios que o tratamento psicoterápico pode proporcionar.
Por que é importante a pesquisa sobre psicoterapia?
Quando se observa a produção de pesquisa em psicoterapia na atualidade, verifica-se que a compreensão dos aspectos que contribuem para a mudança continua a ser um desafio. Conhecer os mecanismos de ação terapêutica pode elucidar conexões entre o que ocorre no tratamento (processo terapêutico) e os diversos resultados, permitindo direcionar melhor as estratégias que podem desencadear o processo de mudança em psicoterapia bem como delinear intervenções com base nas necessidades e especificidades de cada paciente.
A investigação acerca da ação terapêutica contribui à área de ensino, fomenta a discussão teoria-técnica e auxilia no aprimoramento de terapeutas em formação. Além disso, gera conhecimento que favorece o atendimento adequado das demandas dos pacientes e repercute no sistema público de saúde, no momento em que intervenções custo-efetivas podem ser implementadas.
Assim, conhecer o processo das psicoterapias independentemente de sua orientação teórica e duração, seja de curto ou de longo prazo, pode ser fundamental para identificar quais pacientes se beneficiarão suficientemente da primeira e quais necessitarão da segunda. Além de uma perspectiva clínica, contempla-se também um importante aspecto econômico em sua dimensão temporal e financeira.
Especificamente no contexto brasileiro, as pesquisas em psicoterapia, especialmente no que tange ao processo psicoterápico, ainda são incipientes. Existem poucos estudos sistemáticos e a avaliação do processo bem como o consequente efeito das intervenções psicológicas permanece sendo um importante desafio para pesquisadores e clínicos. Ou seja, trata-se de uma prática bastante difundida, porém ainda pouco estudada empiricamente no contexto da nossa cultura.